sexta-feira, 11 de junho de 2010

A justa luta contra a teoria "buy and hold"

In "Jornal de Negócios Online":

(Onde o autor regressa a tema bolsista e logo sobre um assunto causador de grandes prejuízos - a estratégia de "comprar e guardar", mesmo quando o mercado se encaminha para o "crash" - sobre o qual vem desencadeando há anos uma Grande Cruzada, mais intensa que a do Indiana Jones. Tudo a bem das poupanças-investimentos e da felicidade dos investidores individuais).

 

Na generalidade, os mercados desde meados de Janeiro vêm aumentando a volatilidade e acumulando perdas, as quais na Euronext Lisbon vão em cerca de 20%, o que cria ainda mais uma vez a oportunidade para exorcizar os que compram as acções e as guardam no cofre. Alguns até usam o refrão do "forever and ever" e dizem ostentar o maior desdém pelos humores do mercado e os labregos que fogem às perdas (1) (cada vez são menos, claro, porque até os cegos acabam por aprender o caminho e os tropeções têm sido muitos).

 
Como afirmei numa entrevista ao "Diário Económico" no fim do ano passado, há 40 anos que vejo como maior causa de perdas dos investidores individuais a atitude de ficar agarrado "ao papel" quando as coisas desabam nos mercados, seja por vício psicológico de procrastinação, atrasando, atrasando até já ser tarde, seja pela filosofia de, partindo da excelente metodologia de "value investing", cair no pretenso corolário de "comprar e guardar", seja por confundir isto com uma estratégia (altamente recomendável) de investir a longo prazo, em bola de neve. Muita desta gente até acaba por desistir, desmotivada, conservando uma carteira de acções poeirentas no seu banco, a dar despesa em guarda e comissões.


Estes factores causais resolvem-se com recurso ao psiquiatra nuns casos ou correcta análise das falsas premissas, suportada desde logo pela evidência empírica. Sá para disparar a primeira salva: faz algum sentido guardar uma acção ou uma carteira, perdendo 50%, por exemplo, até esperar que elas subam 100% para voltar ao preço inicial? Eu diria que isto é irracional (2).

Como é possível dizer, sem mais, que se deve ignorar o mercado, quando ele está lá, sente-se fortemente e até é o maior factor de influência geral das cotações - como afirma ao longo dos anos o prof. Ibbotson, a partir de séries longas de dados, ele que é considerado a maior autoridade mundial na matéria.


Anote-se, porém, o que disse em epígrafe, indicando como destinatário desta mensagem quase religiosa o investidor individual, principalmente pequeno. É evidente que um "patrão", um investidor com participação estratégica ou um fundo de pensões, tem outra maneira de actuar, devido ao tipo diferente de interesses, de vantagens respectivas e de tácticas, num jogo assimétrico. De resto, quase todos seguem atentamente o mercado, mesmo os CEO e restantes administradores que até são obrigados por lei a comunicarem as suas transacções de acções às Comissões de bolsa, tal o valor da informação que tal revela sobre os movimentos esperados do mercado.


A ideia de conservar os títulos (não necessariamente comprar e guardar) vem principalmente do interesse comprometido de Fundos de investimento que instam os investidores a manterem as unidades de participação durante pelo menos , apenas pelo facto de, a longo prazo, as acções ganharem valor. Mas se os 5 anos coincidem com um forte "bear market", qual a ideia senão a de tentar conservar o cliente? Não era trágico conservar um Fundo a partir de meados de 2007, por exemplo? Na verdade, tudo depende do tempo do mercado, não da estatística.


Dir-me-ão (erradamente) que Warren Buffett preconiza a estratégia "Buy and hold" e eu tenho grande reverência pelo homem de negócios, o investidor, o consultor presidencial, o filantropo, a pessoa simples e íntegra. O que ele diz, sim, repetindo o seu professor e criador da "value investing", Benjamin Graham, é que se deve comprar uma acção como se se adquirisse a empresa toda e que não se consegue adivinhar o mercado, o "senhor mercado". Aliás, aquela suposta assunção é incompatível com outras afirmações, principalmente dando a ênfase à ideia de não perder e indicando quando vende as acções (3). Tão pouco se ajusta com a aposta em posições "curtas" que pratica com tal intensidade que foi interpelado pela SEC, em Agosto de 2009.


E para se ter a prova provada do que afirmo, passo aos leitores a notícia publicada no Barron's de que o mago de Omaha despejou ultimamente as acções que detinha em várias companhias: Sun Trust Bank, Traveler's Insurance, United Health Group, MT Bank, Wellpoint e Carmax e reduziu fortemente as "velhas" e supostamente inabaláveis Johnson&Johnson, ConocoPhilips, Moody's e Proctor and Gamble.

 
Ainda ficaram dúvidas?


NOTA - Este tema é aqui recorrente, mas justifica-se pela religiosidade e notícia da Barron's.
1) Até há uns anos o que estava na berra na frente académica eram as teorias da Eficiência dos Mercados Financeiros e Comprar e Guardar.
(2) A Berkshire Hataway de Warren Buffett caiu desde 2007 a 2009 de 150.000 USD para 83.000. Agora, fez um enorme desdobramento ( "split") de acções para se tornar mais acessível e líquida.
(3) Quando deixarem de ter os rácios que haviam justificado a compra.


Advogado, autor de "Ganhar em Bolsa" (ed. D. Quixote), "Bolsa para Iniciados" e "Crónicas Politicamente Incorrectas" (ed. Presença). fbmatos1943@gmail.com

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