sábado, 27 de agosto de 2011

A aridez financeira da Europa

In “Jornal de negócios online”:

"Abril é um mês cruel", escreveu T.S. Eliot no início do seu grande poema, "The Waste Land" (Terra Árida).

Mas se Eliot tivesse sido um investidor profissional, que analisasse os mercados financeiros europeus durante os últimos anos, tenho a certeza que a sua escolha teria sido Agosto.

 
Em Agosto de 2007, quando o BNP Paribas decidiu encerrar dois dos seus "hedge funds" expostos ao "subprime" precipitou, nesse Verão, uma crise de liquidez em todos os bancos europeus. Este ano, o grande rival do BNP, Société Générale, foi o centro das atenções.

Em meados de Agosto, as suas acções caíram mais de 14% num só dia, tendo atingido o nível mais baixo em mais de dois anos e meio, devido a rumores de que o "rating" da dívida soberana francesa poderia ser reduzido, o que teria impacto nos bancos franceses.


A evolução da crise colocou, no entanto, os balanços dos bancos europeus no centro das atenções.


Desde o início da crise financeira, muitos bancos da Zona Euro fizeram muito menos progressos para fortalecer o seu capital e liquidez do que os norte-americanos e os britânicos. As disparidades foram expostas no último Relatório de Estabilidade Financeira Global do Fundo Monetário Internacional, publicado em Abril, que contém uma análise impressionante sobre as alterações no capital em acções ordinárias durante os últimos dois anos e o nível de dependência dos bancos ao financiamento dos mercados de crédito. Um membro de um banco central da União Europeia descreveu-a como a "tabela mortal".


O relatório mostra que os bancos norte-americanos aumentaram o seu capital de 5,5% para cerca de 7,5% e diminuíram a sua dependência do financiamento nos mercados de dívida de 30% para 25%. Os bancos britânicos fizeram menos progressos, tendo aumentado o seu capital de 3% para pouco mais de 4% mas reduziram, significativamente, a sua dependência do financiamento nos mercados de dívida, de quase 45%, em 2008, para 35%.


Pelo contrário, os bancos da Zona Euro mantiveram os dois indicadores praticamente inalterados. O seu capital aumentou ligeiramente mas permaneceu inferior ao dos bancos do Reino Unido (e muito abaixo do capital dos bancos norte-americanos) e continuam a depender dos mercados da dívida para quase 45% do seu financiamento total.


É por este motivo que a incerteza sobre a integridade da Zona Euro e o valor da dívida soberana dos seus Estados-membros está a ser tão penalizadora para os bancos. Dadas estas circunstâncias, serão os bancos da Zona Euro capazes de refinanciar as suas dívidas nos mercados? Os países que receberam ajuda externa foram excluídos dos mercados da dívida e dependem quase exclusivamente do Banco Central Europeu. É possível que isto aconteça a bancos de outros países?


Em 2007 e 2008, foram os políticos que sofreram com os pecados dos banqueiros; agora a situação reverteu-se. Talvez exista uma diferença: os pecados dos banqueiros foram pecados de acção, enquanto os pecados dos políticos - os diversos esforços falhados para produzir uma solução à escala do problema - são pecados de omissão. Mas as consequências são igualmente graves.


Sempre achei que a Alemanha acabaria, eventualmente, por reconhecer que era do seu interesse preservar a Zona Euro intacta. Churchill afirmou sobre os americanos: "Podemos sempre contar com eles para fazer o que está certo… assim que todas as alternativas possíveis forem esgotadas". Os alemães já esgotaram quase todas as possibilidades. Se, em breve, não fizerem o que está certo, alguns bancos poderão enfrentar sérias dificuldades e os governos europeus vão ser obrigados, mais uma vez, a injectar dinheiro público nas instituições. Isso será tão impopular como resgatar a Grécia e, possivelmente, muito mais caro.


Howard Davies, antigo presidente da Autoridade de Serviços Financeiros do Reino Unido, vice-governador do Banco de Inglaterra e director da London School of Economics, é professor na Sciences Po em Paris.

Sem comentários:

 
View My Stats