terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Os vencedores e os vencidos da depreciação do dólar

In "Jornal de Negócios Online":

untitled A actual depreciação do dólar americano face às principais moedas deverá ajudar a reparar alguns dos desequilíbrios comerciais a nível mundial, mas o proteccionismo pode ser uma grande ameaça durante a lenta recuperação no consumo.


A fraqueza do dólar pode ajudar a reparar desequilíbrios comerciais a nível mundial
Num mundo ideal, um dólar mais fraco deveria ajudar a reparar o défice da balança corrente dos EUA e levar a uma recuperação mais saudável impulsionada pelas exportações, dando mais tempo aos consumidores norte-americanos para desalavancarem e encorajando-os a regressarem lentamente ao mercado, quando e à medida que o desemprego recuasse.


Contudo, para que o dólar permaneça fraco, outras moedas têm de se manter fortes. Isto levanta a questão sobre se os países de todo o mundo podem suportar a manutenção de uma moeda forte face ao dólar numa altura em que a procura global está tão fraca?


Os países com grandes excedentes devem ser os candidatos óbvios a permitirem a apreciação das respectivas moedas, dado que podem permitir-se reduzir estes excedentes. Contudo, tendo beneficiado ao longo da recessão de grandes reservas de divisas, não há incentivo óbvio para que um país se reaprecie.


A China não pode depender apenas das exportações
A China, que dentro em breve ocupará o lugar da Alemanha como o maior exportador mundial, encontra-se num clássico dilema do prisioneiro. Se "colaborar" e deixar que o renminbi se aprecie, todo o mundo ficará melhor. Não obstante, a tentação a curto prazo é manter o crescimento económico aumentando ainda mais a sua percentagem no total de exportações mundiais (actualmente em cerca de 9%).

Prosseguir com uma política pró-exportações, porém, serviria apenas para aumentar os desequilíbrios comerciais mundiais e seria insustentável a longo prazo. Ao contrário do Japão, a China é demasiado grande para basear o seu futuro crescimento apenas nas exportações e precisa de encorajar o consumo interno para usufruir de um crescimento sustentável.

 
A força do euro poderá ter um menor impacto
O que se pode dizer do dólar face ao euro? Se incluirmos o comércio inter-regional entre os 27 Estados-membros da UE, as exportações europeias representam 40% (1) do comércio mundial. A Alemanha continua a ser o maior exportador mundial, à frente da China e dos EUA, com as exportações a representarem perto de 40%(2) do PIB alemão. A França, a Itália e a Holanda figuram, igualmente, entre os dez maiores exportadores mundiais.


Teoricamente, nem o conjunto da área do euro, nem a Alemanha em particular, podem suportar um euro ainda mais forte. Porém, se excluirmos o comércio entre os países da área do euro, as exportações da região representam ainda uns significativos, mas bastante inferiores, 16% das exportações mundiais. Três quintos do comércio da área do euro realizam-se dentro da região da moeda única. Isto significa que os diferenciais de produtividade e inflação entre os Estados-membros são mais importantes para a competitividade do que os movimentos monetários.


Isto não é o mesmo que dizer que um euro forte não teria efeitos no comércio. Afinal de contas, a balança comercial entre a área do euro (3) e os EUA ainda está nos 13%. Mas o efeito seria menor que o geralmente assumido. Agora que a deflação já não merece preocupação, um euro forte também deve merecer menor preocupação da parte do Banco Central Europeu, dado que mitigará o risco de uma maior inflação a longo prazo.


Para o Japão, contudo, uma maior apreciação do iene face ao dólar dos EUA pode ser um desafio. Cerca de 20% das suas exportações ainda vão para os EUA, embora a China esteja a transformar-se rapidamente no principal parceiro comercial. As exportações para a China representavam menos de 9% do total de exportações japonesas em 2000, mas em 2007 já ultrapassavam os 18%.


A força das moedas de mercadorias pode ser positiva
E sobre as moedas exportadoras de mercadorias? Uma maior apreciação destas moedas face ao USD pode ser positiva. A curto prazo, a força da moeda produziria inflação geral através de mais elevados preços da alimentação e da energia, o que faria diminuir o rendimento disponível dos consumidores.


Mas uma vez incorporada nas expectativas, uma modesta subida na inflação tendencial contribuiria para a desalavancagem do sistema. Uma maior apreciação do dólar canadiano seria especialmente benéfica para os Estados Unidos, dado que o Canadá é o maior parceiro comercial dos EUA. Perto de 23% das exportações dos EUA vão para o Canadá, uma percentagem superior à do total da União Europeia.


Quais são os principais riscos? Tal como qualquer mudança, o problema é saber "quanto é demais". Uma prolongada depreciação do dólar dos EUA pode acabar por prejudicar a posição dos EUA perante os seus credores, limitando a atractividade da dívida norte-americana quando o crédito é mais necessário.


O maior risco, ainda assim, será o proteccionismo. Num mundo em que o consumo será cada vez mais valioso, a tentação será de impor maiores tarifas e limites absolutos sobre as importações e favorecer as indústrias locais, especialmente se a recuperação ocorrer "sem empregos". Isto limitaria a capacidade do comércio global para ajudar a recuperação e dos ajustes monetários para repararem alguns dos mais graves desequilíbrios da economia global.


1 Fonte: Estatísticas europeias
2 Fonte: Organização Mundial do Comércio
3 Fonte: Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Grécia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Holanda, Portugal


Director de vendas da JP Morgan Asset Management

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