quinta-feira, 21 de abril de 2011

Grécia associa subida dos juros da dívida a comportamento criminoso

In "Jornal de negócios online":

Atenas vai iniciar uma investigação, depois dos juros da dívida terem disparado para novos máximos e da bolsa ter descido mais de 3%. Em causa poderá estar um e-mail "de um banco de investimento internacional" que dá como certa a reestruturação da dívida grega este fim-de-semana.

 

grecia_george_papaconstantinou_not1_bl "O Ministério das Finanças pediu ao Ministério Público de Atenas para investigar uma possível conduta criminal associada aos movimentos de hoje na bolsa de Atenas e nos preços das obrigações", pode ler-se num comunicado emitido pelo Ministério das Finanças grego.


Em causa está a subida de 129,4 pontos base, ou seja, mais de um ponto percentual, dos juros das obrigações a dois anos para 22,019%, tendo chegado a tocar nos 22,156% durante a tarde. No prazo a cinco anos, a "yield" das obrigações gregas avançou mais de 30 pontos base para 16,54% e a 10 anos o aumento foi de 27,1 pontos base para 14,751%. Já a bolsa de Atenas deslizou mais de 3%. "O Ministério enviou ao Ministério Público um e-mail de operadores de um banco de investimento internacional que refere uma alegada reestruturação da dívida grega este fim-de-semana."

 

"Tais rumores são vazios de qualquer substância e roçam o ridículo", garante o ministério das Finanças
As entidades gregas adiantam que "a divulgação de tais 'notícias' falsas podem criar problemas entre o público em geral" e, por isso, "o Ministério das Finanças vai usar todos os meios legais disponíveis, a fim de identificar e perseguir os responsáveis​​", adianta a mesma fonte.


A Grécia tem estado sob forte pressão, numa altura em que os rumores sobre uma possível reestruturação de dívida são cada vez mais fortes.


Lars Feld, conselheiro económico de Angela Merkel. "A Grécia não vai sair desta situação sem algum tipo de reestruturação da dívida", afirmou.


Antes dele o governador cipriota do Banco Central Europeu, Athanasios Orphanides, rejeitou a necessidade de Atenas reestruturar a sua dívida e alertou para o efeito contágio que essa medida teria. "Seria muito prejudicial para a Zona do Euro em geral, devido à possibilidade de contágio", salientou.


E de facto, o comportamento do mercado espelha este efeito dominó. Não foram apenas os juros da dívida grega que dispararam. Portugal e Irlanda voltaram a sentir subidas acentuadas nos juros da dívida, atingindo também máximos desde a entrada no Euro.

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GLOSSÁRIO

Incumprimento
Define o momento em que uma entidade deixa de ter liquidez para pagar os juros do dinheiro que pediu emprestado, ou para devolver o capital ao credor. Quando um Estado entra em bancarrota, tem de renegociar as condições do seu empréstimo, renegociação essa que pode levar a alterações no valor dos juros prometidos, na maturidade dos títulos ou no valor do capital. Em regra, os credores preferem negociar a ir para tribunal, uma vez que os soberanos estão juridicamente bem protegidos.


Reestruturação/renegociação de dívida
É um processo com consequências semelhantes aos descritos no ponto anterior, mas ocorre ainda antes de os Estados chegarem ao "fim da linha". Os governos tomam a iniciativa de se sentarem à mesa com os credores, antes de entrarem em incumprimento. A História mostra que esta antecipação costuma ser premiada pelos investidores.

"Haircut"/desconto
É a perda de capital e/ou juros que decorre de uma renegociação de dívida ou do incumprimento no pagamento dos seus juros ou reembolsos.

Ver:

FT diz que e-mail que levou a subida dos juros é de funcionário do Citigroup

Bancos vão ter dinheiro do Estado para passar stress

AO online - A ameaça:

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O dia 16 de Setembro de 1992 calhou numa quarta-feira e nada teria tido de especial se não tivesse ficado para a posteridade como a Quarta-feira Negra, a “Black Wednesday” da City de Londres. O Governo Britânico andava aos avanços e recuos, a negociar a posição da libra no Sistema Monetário Europeu (SME), hesitando entre ficar de fora ou flutuar dentro dos limites do Mecanismo de Taxas de Câmbio (MTC).

O anúncio pelos britânicos da saída da libra do sistema, por não terem conseguido mantê-la acima do seu limite inferior de flutuação (na ocasião, 2,778 marcos alemães), provocou uma onda de choque. Nessa quarta-feira, havia plenário no Parlamento Europeu e no dia seguinte o falatório entre os eurodeputados foi vivo, embora a simpatia pelos ingleses não fosse calorosa, havendo quem achasse que tinha sido melhor saírem do SME.

A postura imperial que sempre exibiram, comportando-se de modo a terem um pé dentro e outro fora do projecto europeu, o facto de terem recusado aderir ao SME em 1979, ao qual só aderiram em 1990 pela mão de John Major, além da conhecida função de “cavalo de Tróia” dos norte-americanos, suscitou posições controversas em Estrasburgo. Nas discussões em que participei, especialmente com os eurodeputados portugueses e espanhóis que partilhavam o voo especial da Air France que nos levou de volta, após aquela semana em Estrasburgo, foi muito comentado que a culpa era das altas taxas de juro alemãs, consequência da reunificação germânica.

Para conter a inflação resultante do excesso de despesa provocada pela integração da Alemanha Oriental na República Federal Alemã, o Bundesbank aumentou essas taxas, causando tensões que atingiram especialmente o Reino Unido. Naquela época, o dólar americano andava a perder valor; como os ingleses, desde sempre ligados aos Estados Unidos, têm as suas exportações expressas em dólares, viram a libra esterlina andar para trás.

A crise da Quarta-feira Negra custou ao Tesouro britânico cerca de 27000 milhões de libras para tentar aguentar o valor da moeda, mas foi aproveitada pelo especulador George Soros, que vendeu nesse dia mais de 10000 milhões de dólares em libras através do seu Fundo De Gestão, antecipando e forçando a queda da libra, numa operação designada tecnicamente por “short selling” que lhe rendeu 1100 milhões.

Esta história de Soros e da Black Wednesday, cujo desenrolar acompanhei no Parlamento Europeu, tem muito que ver com o que se passa actualmente com a especulação gigantesca que rodeia as difíceis situações financeiras da Grécia, Irlanda e Portugal. Por detrás destas crises, não é difícil ver quem vai ganhar escandalosas somas de dinheiro, a um nível mesmo superior ao lucro do Soros Fund, quando fez ajoelhar os ingleses.

Uma breve incursão no mundo nebuloso das Forex (Foreign Exchange), como são conhecidas as operações financeiras baseadas no câmbio de moeda, mostra-nos que, em média, 80% são especulativas; que têm um movimento médio diário (turnover) de 4000 milhares de milhões de dólares, mais do que toda a riqueza produzida pela Alemanha num ano; e que, das 10 principais instituições mundiais deste sector, 4 são americanas, 3 são britânicas, 1 alemã (DB-Deutsche Bank, nº1) e uma suíça (UBS, a nº2).

A UBS e o DB detêm juntos 30% do mercado mundial. O euro, ao valorizar-se e concorrer com o dólar como moeda de reserva mundial, veio baralhar este jogo, tornando-se um alvo a abater. Começando, logicamente, pelos elos mais fracos.

Para se perceber melhor a teia em que estamos enredados, é importante fazer também uma curta viagem às trevas dos “hedge funds”, os fundos especulativos que regem a grande economia e finança globais. Investem em tudo, das “commodities” (petróleo, cobre, café – tudo o que se extrai, cultiva e vende) aos títulos de dívida dos países.

No contexto internacional, aquilo a que eufemisticamente se chama os “mercados”, é dominado pelo peso esmagador de duas dúzias de gigantes gestores destes fundos, que geriam 520 mil milhões de dólares em 2009.

O maior destes tubarões é a J P Morgan, que valia 54000 milhões e faz parte do colosso americano J P Morgan Chase, o qual teve lucros em 2010 da ordem dos 17000 milhares de milhões.

Destes senhores do mundo especulativo existem 13 que são os maiores de todos: 9 são americanos e 4 são ingleses.

Dois terços dos dinheiros dos “hedge funds” estão em offshores, com as ilhas Caimão à cabeça (5% do total estão na Bermuda). Estes meninos são os verdadeiros donos do futuro de empresas, países, políticas e políticos. Tudo o resto é fantasia.

O que não é fantasia, mas uma dura realidade, é os países pequenos como Portugal terem políticos pequeninos, navegadores à vista, incapazes de perceber e controlar, dentro das competências que possuem, o endividamento externo e interno, fomentando uma produção de bens capaz de permitir que se viva dentro das nossas possibilidades.

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Vasco Garcia

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